domingo, 21 de dezembro de 2014

Neruda estava lá

Era uma tarde tranquila e solar quando ele mandou a ela seu conto, um arquivo composto pela mais pura malicia,  lascívia e desejo. A epígrafe era um poema de Neruda, que hoje já não recorda; leu e releu várias vezes, e reescreveu com sua letra imatura e um fogo avassalador, tentou colocar o papel com o poema de Neruda na mochila dele, tentou debaixo do caderno, tentou no bolso da calça, mas seu medo de menina virgem não deixava.
Olhavam-se ardentemente, o membro envaidecia ao ouvir a doce voz da menina lendo um poema, suas peles queimavam e pediam um ao outro. O tempo passava e o desejo aumentava, entre Neruda e Bashô uma faísca alucinada.  Ela ardia de tanto desejo, poemas e mais poemas para mostrar-lhe que era a ele que ela queria. As conversas eram cada vez mais quentes, os toques pareciam lhe tocar a alma, ela andava pelas ruas tendo sensações orgásticas.
Neruda estava lá, até quando não estava. Depois de se entregarem um ao outro, depois do mais carnal prazer, depois da elevação do espírito, tudo florescia, tudo era solar, tudo era música e poesia. Ao som de Chico Buarque eles se beijavam e se amavam, os dois corpos de pele macia causavam um frisson no universo.
Naquela tarde, ele esqueceu o livro de Neruda, mas suas línguas ocuparam o vazio, o fogo citado nas poesias agora fazia parte do mundo real, eles eram chama, eram letras, eram um copo de tequila, ou quem sabe um café da padaria da esquina, eram uma canção, eram uma poesia, uma poesia de um livro de Pablo Neruda.


(Nathally Amariá)